A Companhia Antarctica tem uma importância muito grande para a Mooca. Além de ter empregado milhares de moradores da região, a empresa mantinha uma escola de boa qualidade destinada principalmente para os empregados e para seus filhos, construiu, também, uma vila residencial para seus técnicos, além de criar e manter um clube – o ARCA – de saudosa memória não só pelos momentos alegres que proporcionou aos seus usuários como também por possuir um time de futebol que alcançou muito sucesso na várzea paulistana.

Certamente é muito difícil de acreditar mas a Antarctica, fundada em 1885, de propriedade de Joaquim Salles junto com outros sócios, localizada no bairro de Água Branca, na cidade de São Paulo, era um abatedouro de suínos, produtora de presunto e outros derivados de carne de porco, além de ser, também, produtora de gelo, daí o nome do continente gelado.

Ainda em 1885, a Antarctica ganha sua primeira logomarca: uma estrela de seis pontas com a letra “A” inscrita em seu centro. A estrela, usada pelos fabricantes europeus desde a Idade Média.

Em 1888, o cervejeiro alemão Luiz Bücher, que desde 1868 possuía uma pequena cervejaria, sabedor que era da ociosidade da fábrica de gelo da Antarctica e de que a empresa era dotada de água limpa e de frigoríficos para acondicionar a bebida propôs uma sociedade a Joaquim Salles.

Com o êxito da negociação criou-se a primeira fábrica de cerveja do país com tecnologia de baixa fermentação, com uma capacidade de produção de 6 mil litros diários. A Antarctica teve seu primeiro anúncio publicado no então jornal “A Província de São Paulo”, atual estado de São Paulo, em março de 1889: “Cerveja Antarctica em garrafa e em barril – encontra-se à venda no depósito da fábrica à Rua Boa Vista, 50”.

Interessante citar que o primeiro logotipo feito para reproduzir a decantada cerveja trazia dois ursos brancos polares sobre um campo de gelo, supostos habitantes do continente antártico, a Antártica (na marca, grafada como Antarctica). Mas por não haver ursos no pólo sul, o símbolo logo mudou para os dois pingüins sobre um campo de gelo, que prevalece até hoje.

Sob a perspectiva do contexto histórico, o Brasil passou da fase colonial para a República, em 1889. Nesta época o Brasil efetivamente iniciava seu processo de industrialização. Em 09 de fevereiro de 1891 foi oficialmente fundada a “Companhia Antarctica Paulista” como sociedade anônima, com 61 acionistas.

A primeira crise, no entanto, aconteceria apenas dois anos depois, em 1893, quando a oscilação do mercado cambial e a necessidade de importação de matéria-prima trouxeram sérios problemas para manter o ritmo da produção. Neste momento, outro alemão, Antônio Zerrener, proprietário de uma casa de importação, fez um acordo com os acionistas e passou a ter o controle de mais de 50% do capital da companhia, encabeçando a lista de acionistas pelo resto da vida. A participação da cerveja no mercado, neste período, aumentou significativamente até se tornar uma das bebidas mais populares do país. Num segundo momento, a Antarctica diversificaria seus investimentos, marcando os anos 20 com o início da produção de seu famoso guaraná.

O produto foi lançado no mercado brasileiro no mês de abril de 1921 pela Companhia Antarctica Paulista com o nome de Guaraná Champagne Antarctica. O novo refrigerante só foi lançado no mercado quando os técnicos da empresa conseguiram eliminar a adstringência e o amargor natural da fruta. Além do agradável sabor, uma de suas principais características era ser um refrigerante natural. Num inteligente lance de marketing, a empresa apresentou uma bebida com características espumantes, o que contribuiu para associá-la ao champanhe, bebida com bastante prestígio junto aos consumidores. Desde aquela época, a Antartica já comprava o fruto do guaraná diretamente de fornecedores da região de Maués (Amazonas) para produzir o extrato na sua unidade industrial localizada na cidade de São Paulo. A famosa versão Caçulinha do Guaraná Antarctica foi lançada em 1949, em garrafinha de vidro de 185 mililitros, embalagem até então inédita no Brasil. As embalagens pequenas e de fácil transporte, eram perfeitas para o lanche das crianças e passeios com toda a família.

A sob a direção da Zerrener, Bülow & Cia. a empresa foi reorganizada e focou-se na fabricação de cerveja e refrigerantes. A partir de então recuperou-se e passou a crescer rapidamente, sendo que em 1904 adquire o controle acionário da Cervejaria Bavaria, na Mooca, que pertencia à Henrique Stupakoff & Cia. Neste local em 1920 passou a se situar a sede do Grupo Antarctica.

Em 1923 morre Adam Von Bülow deixando 5 filhos como herdeiros, dos quais dois vendem ações da companhia ao sócio Zerrenner, que se torna majoritário. O filho primogênito Carl Adolph Von Bülow passa a representar a família dos Von Bülow na direção da empresa.

A partir de 1930, Antarctica e Brahma passaram a eliminar quase todas concorrentes e dividiam a liderança da produção de cerveja no Brasil.

Zerrenner morre em 1933 sem deixar herdeiros e seu testamento pedia que seus bens fossem enviados à Alemanha. O testamento foi anulado e os bens passaram para a esposa Helene. Esta faleceu em 1936 sem deixar herdeiros no Brasil e os bens de passaram para a Fundação Antonio e Helena Zerrenner.

O testamenteiro Walter Belian se torna administrador da Antarctica mantendo um gentlement agreement na administração da empresa junto com a família Bülow, que foi rompido em 1942 após a morte de Carl Adolph Von Bülow. Seguiu-se então uma longa disputa pelo controle da companhia, a filha de Adam Ditrik Von Bülow, Andrea de Morgan Snell que tinha guardado suas ações nomeou seu marido Luis de Morgan Snell como presidente do grupo até 1952. Walter Belian morreu em 1975.

Somente em 1944 a Fundação Brasileira conseguiu incorporar ao seu patrimônio os bens deixados pela viúva do casal Zerrener, que contavam 58,74% do capital social. A partir desta data, a empresa voltou-se à expansão da produção, importando maquinários da empresa americana Geo J. Meyer Mfg.

Em 1939 houve um fato curioso, quando Ademar de Barros, interventor federal do Estado Novo de Getúlio Vargas ocupou militarmente a Antarctica e prendeu seus diretores, por considerar que a empresa era “uma propriedade de alemães”. Posteriormente, o próprio Getúlio interveio, desculpando-se junto à empresa pelo mal entendido.

Em 1986, depois falecimento de Luis de Morgan Snell seguiu no conselho de Administração da Antarctica Paulista o segundo acionista do grupo depois da Fundação Antonio Helena Zerrenner seu neto Louis-Albert de Moustier que vendera sua participação em 2003 terminando a historia da família von Bullow na Antarctica.

Poucos sabem, também, que nos anos 1900 a cervejaria criou um espaço de convívio e lazer no Bairro de Água Branca, o Parque Antarctica de São Paulo (que atualmente abriga o estádio de futebol do Palmeiras), com a finalidade de tornar a bebida popular. Conseguiu, pois uma multidão corria ao Parque da Antarctica nos finais de semana e feriados. Ali havia bosques, pavilhões rústicos lembrando a Alemanha (terra da cerveja), pista de esportes, carrossel e restaurantes. Em 1920 a Antarctica vendeu para a S.E Palmeiras, a baixo preço o terreno de 150 mil metros quadrados em troca de um contrato perpétuo de venda dos produtos da companhia.

Infelizmente, do ponto de vista econômico, mas muito mais afetivo, de nossa memória, “perdemos” a Antarctica na Mooca, para a cidade de Jaguariúna, interior paulista, e para outras partes do Estado e do país. Ela se internacionalizou, virou Ambev junto com a Brahma, em 1999, e até hoje não deu um destino certo ao seu antigo endereço. Tanto que essa área industrial é tida como obsoleta e ociosa em São Paulo, alvo certo dos especuladores imobiliários.

As grandiosas instalações da Cia Antarctica na Mooca, vazias, ainda se encontram na Av. Presidente Wilson e, pela sua importância histórica e arquitetônica, encontram-se em processo de tombamento junto aos órgãos competentes. A população mooquense luta pela sua preservação arquitetônica e transformação em um espaço público destinado a cultura e lazer.

Fontes :

http://www.wikipedia.com

http://www.ambev.com.br/emp_03b.htm

http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/junho2006/ju327pag8c.html

http://saopauloabandonada.com.br/antarctica-paulista/

Agradecimentos especiais a Elizabeth Florido e Douglas Nascimento