GUIDO PIVA

Muitos jovens têm dado boas gargalhadas ao lerem o livro “Orra Meu!…O Canto da Mooca” . Quanto aos adultos, na faixa dos 40, 50, 60…anos, além das gargalhadas, certamente derramam algumas emocionadas lágrimas ao relembrarem de locais, fatos e pessoas que fizeram parte de seu passado, numa época em que, apesar de tudo havia mais alegria, mais amizade, mais cordialidade e… muito mais segurança que os dias atuais, tudo isso contado em versos escritos em “mocanhes”, pelo poeta Guido Carlos Piva.

Guido, citado como o “Poeta da Mooca” pelo jornalista Geraldo Nunes no livro “São Paulo de Todos os Tempos “, nasceu na Baixa Mooca, filho de imigrantes italianos da região de Mantova, por parte de pai, e de espanhóis da região de Granada por parte de mãe. Casado com uma portuguesa, Maria Helena, ( como vêem, ele é globalizado) com quem tem duas filhas ( Camilla e Natasha) e um filho (Guidinho).

Guido Piva e esposa em entrevista para o Portal da Mooca
Arquivo: Portal da Mooca
Camilla, Guidinho e Natasha, filhos de Guido Piva
Arquivo : família Piva

O livro alcançou grande sucesso, principalmente pela sua originalidade, sendo objeto de inúmeras reportagens nos órgãos da imprensa. Ainda hoje, Guido é convidado habitualmente para entrevistas em rádios, jornais e televisão. Fala-se da Mooca, lembra-se do “Orra Meu…”

Anteriormente, em 1998, Guido já havia publicado o livro de poemas “Talvez Poesias….” mas, após o “Orra Meu…” não parou mais de escrever, com dezenas de poemas inseridos na internet em sites especializados. estando agora prestes a publicar o “Mooca é Mooca, Bairro é Bairro” no mesmo estilo do “Orra Meu”.

Teríamos muito ainda a falar a respeito do nosso poeta, mas vamos optar por transcrever uma sintética autobiografia, obviamente por ele escrita na sua linguagem predileta:

“O mio nomi é Pimpinello Rizoni, ma podi me tratá só di Pimpinello. O Orra meu! Io sô da Móca! O Rizoni é só perquê tenho pelo rizo uno amore piú grandi.

Io nó nasci na Intália, sô apena neto de intaliano e d’ispanhó. Come giá dice, io nasci na Móca, naqüela qui chiamavam di Móca-baxa, precizamenti na Rua Coroné Bento Pires, qui ainda fica nas ridondezas do inízio da Avenita Radiá Lesti, bem atráis do hospitale D. Pedro II, pertinho de la rua da Paz, qui oggi si chiama Lirismo. Fô nessas due rua ondi vivi os primo ani de la mia vita. Qui ani!
Vivi la mia infanzia nessas rua qui falê, ma la mia adolecênzia e gioventú vivi e morê na rua Conselhero Juó Arfredo, travessa da rua dela Móca, nas imediaciones dela Rua Piratininga, lá nas ridondezas dela rua Dona Ana Neri, ondi ainda si situa la famoza churraria da sodoza Dona Dolores. Orra meu! Qui churro! Para sê mai ezato, io vivi per tutta ridondeza da estensioni interinha do bairro e da cumpridona Rua da Móca

Primeiro livro escrito por Guido Piva
Capa do livro “Orra meu!”

Oggi, giá passê di mezzo sécolo de idadi, ma me considero cum la testa di um bambino. Nasci na mia caza, im 3 di julhio de 1947, no após guérre. E nasci nas mano di una boluda e buona sinhora qui si chiamava Dona Giozefina, qui, naqüeli tempino e naqüela regió da Móca, era a partera di tutta la genti qui ia ganhá nenê, e, claro, mia mamma, qui també si chiamava Dolores – qui mamma! –, non pudia querê sê deferente.
Memo mi considerando um bambino, mia vita istá quasi compreta: giá iscrevi uno libro, tive filhios e giá plantê moltas árvore. Questo é mio segondo libro qui iscrevo. O primo, qui iscrevi, nó iscrevi come Pimpinello Rizoni, e si, come Guido Carlos Piva, mio nomi di batismo. Essi primo libro si chiama “Talvez poesias…”, totalmenti iscrito im portuguêis, bem deferente desti, qui, come dice, é iscrito solamenti im mocanhês.

Come quis dizê… im qüesta vita, giá fiz di tutto um pó – ô pelo meno imagino qui fiz –: giá cantê, dancê e vivi intensamenti os tempi de las múzica dos Bitous, das do Pepino di Capri e tutti qüelas do inigualábili e inesqüecíbili poeta, també macarrônico, Adoniram Barboza… come també, os tempi do rock dos Mamona Assassina e dos pagodi di alora. Si vivi im tutti os tempi di qui acontecero essas múzica, calcule os mio ani di gianela.
Fui amante e fumante – até oggi sô – amato e fui fumato. Churê e fui churado. Ma, pódi tê cirteza, molto mai ri do qui churê. Io sô do tempo im qui, prá começá a sê ómi, iguali la grandi maioria dos bambini di mia época na Móca antiga, tinha por costume, tê qui si disvirginá, cum treze ô quatorze ani, cum la famoza Marta do Itapura, una putana qui si tornô, naqüela época, ispecialista im bambino qui quiria fazê o fuquifu pela prima veiz. Qui é daqüeli tempo, come io, si fô sincero, vá lembrá e me dá razó.

Pimpinello Rizoni, dico, Guido Piva”

Entrevista concedida em agosto de 2002

Guido Piva, com 18 meses em frente a casa onde nasceu na Rua Cel Bento Pires, 203
Arquivo : família Piva
Guido Piva (primeiro da esquerda para direita) com sua turma
malhando Judas na antiga rua da Paz, hoje Rua do Lirismo (1957)
Arquivo : família Piva

Veja, a seguir, um trecho do livro “Orra Meu…”.

guido7O TEMPO DOS AFONSINHOS
Quero lembrá da Móca,
do tempo dos Afonsinho,
do tempo di pegá amexa,
no quintá lá du vizinho.
Du tempo de si giugá panela,
com barro sugio da rua,
du tempo da Paes de Barros,
só di barro, ma cum lua.

Io quero lembrá da Móca,
du tempo da cachuleta,
du tempo di si pedi um téco,
do lanche de um amico;
tempo di si andá na rua,
de nótte, sem tê perico.
Io quero lembrá dus trilhio,
da rua, di memo nomi,

du onibus Bertioga
qui vinha devagarinho.
Io quero lembrá du bonde…
du “tlintlim”du motornero,
qui ficava no istribo,
xeinho di dinero,
e ningué o assartava,
nem no inízio, nem no meio.

Io quero lembrá da Móca,
da Móca das chaminé,
quando o povo si cumprimentava ,
tirando o seu boné…
e tutta genti si surria,
senza orgulhio… ma com fé .