JOÃO LOUZADA

Louzada comandando passeata
Arquivo: Família Louzada

“Se você ficar muito rico, outros ficarão muito pobres”. Essa frase, dita pelo pai, norteou a vida de João Louzada a partir desse momento.

Filho de Manoel Louzada, um espanhol de Ponte Vedra – Galícia que “veio embora da Espanha para não servir no exército espanhol na África Espanhola e matar negros, porque meu pai tinha uma mentalidade muito elevada” e de Maria Marangoni Louzada, uma descendente de italianos nascida em Guaxupé-MG, nosso entrevistado João Louzada nasceu em 1920 na capital de São Paulo, na região do Mercado Municipal, mas ainda com seis anos de idade veio morar na Mooca.

Quando jovem dedicava o seu tempo quase que inteiro para o futebol e para os bailinhos no Doppo Lavoro, que era uma sociedade basicamente de imigrantes, obviamente com predominância de italianos, cuja sede era na Rua da Mooca quase em frente à Rua Iolanda.E aos sábados e domingos freqüentava o famoso “footing” que ocorria naquele pedaço da Rua da Mooca.

Sempre foi fanático por futebol. Habitualmente ia assistir os jogos no Juventus e lembra com detalhes das escalações não só da equipe avinhada como dos seus adversários que lá jogavam, principalmente do clube de seu coração: o Corinthians.

Louzada também lembra muito bem do campo do 5 de Outubro, onde hoje é a Praça Kennedy: “aquele campo era gramado e cercado e lá só se realizavam bons jogos, por isso todos os clubes queriam jogar lá. Vi muitos jogos do Mecânica, Metalúrgica Matarazzo, Laboratório Paulista, Antarctica, Alumínio Corazza e outros. O famoso jogador Waldemar de Brito também ia muito, até porque o irmão dele jogava lá”.

Por volta de 1936, Louzada participou da fundação de um clube na Mooca – o Progresso Paulista – onde também atuou nas equipes juvenis, aspirantes e até algumas partidas no 1º time. A sede era na esquina da Rua Siqueira Bueno com Fernando Falcão, “depois descobrimos um terreno numa travessa da Rua Almeida Lima, que pertencia a Metalúrgica Picorari e eu fui conversar com eles. O terreno precisava ser nivelado e me ofereci a ir à Câmara Municipal, onde eu consegui emprestado um trator que fez o serviço. Com isso o pessoal resolveu me designar presidente do Clube.”

Mas, independentemente de ajudar o pai na construção civil, Louzada precisava ganhar o seu dinheirinho, além de colaborar com as finanças da casa, indo, com 14 anos de idade, trabalhar na Tecelagem Maria Ângela, de propriedade dos Matarazzo. Acontece que os italianos da fábrica viviam dizendo: “Mussolini na Itália, Carnera (o boxeador) nos Estados Unidos e Palestra Itália em São Paulo” e isso, obviamente, fazia ferver o sangue espanhol, corinthiano e já comunista de Louzada.

Essa formação comunista, herdada de seu pai, foi se consolidando com as injustiças que presenciava na fábrica, com a invasão da Abissínia pela Itália e com a guerra civil espanhola e ascensão do generalíssimo Franco, motivando Louzada a ingressar no Partido Comunista. O seu idealismo e a sua dedicação fizeram com que passasse a desfrutar de grande prestígio nesse Partido, sendo designado para representa-lo no Congresso Internacional do Trabalhador em Madeira realizado em 1963 em Budapest, ocasião em que foi nomeado Secretário da Comissão das Américas em encontro realizado em Cuba.

Louzada discursando
Arquivo: Família Louzada

Greve na Tecelagem Maria Ângela e o bom operário foi mandado embora. Outras demissões se sucederam, para desespero de sua mãe. Por outro lado, o pai, mais liberal apenas pedia : “só não manche o meu moral”. E foi tentando não manchar o moral do pai que João Louzada viu eclodir a segunda guerra mundial quando, trabalhando na Tecelagem Anglo Brasileira, ganhou uma medalha da FEB-Força Expedicionária Brasileira, por ter sido um dos operários que mais confeccionaram uniformes de campanha.

Nessa tecelagem, Louzada mantinha um ótimo relacionamento com um dos proprietários, o sr. Ariston de Oliveira, sendo o responsável por levar-lhe as reivindicações dos operários e por elas lutar…. até que um dia o velho Ariston se cansou e disse : “é bom operário, mas muito revoltado…”. E o demitiu.

O mesmo aconteceu na Tecelagem Santa Lúcia, onde foi tachado de agitador por distribuir jornais do Partido. E, como estava prestes a casar, foi trabalhar com o irmão na construção civil em uma empresa alemã onde, naturalmente, não poderia dar certo pois, como relembra Louzada, “a empresa era coalhada de ex-nazistas, gente fria como o mármore” e para combater isso, passou a se dedicar ao Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, onde foi um dedicado ativista.

“A massa organizada traz ao homem o que ele necessita” foi o princípio seguido por Louzada , que passou a percorrer os mais distantes bairros da Capital e o Interior do Estado mobilizando a massa, sempre dando prioridade ao convencimento dos operários das grandes empresas pois, e esta era uma outra estratégia sempre adotada, “conquistadas as maiores, as demais vêm atrás”.

A defesa do operariado fez com que Louzada fosse eleito vereador na cidade de São Paulo em 1954, ano de seu quarto centenário, sendo reeleito em 1959. Todavia, com a Revolução de 1964 teve o seu mandato cassado, sendo inclusive preso por um período.

Solto, optou por ficar escondido até o seu processo prescrever e voltar a respirar liberdade. Em 6 de novembro de 1991 os mais de cinqüenta anos de luta em favor do operariado, foram reconhecidos pela Câmara Municipal de São Paulo, que lhe outorgou o título de Cidadão Paulistano.

Hoje, Louzada transformou um cômodo situado no fundo de sua residência, onde recebeu a Equipe do Portal da Mooca para esta entrevista, em uma espécie de Museu João Louzada / Partido Comunista, onde preserva uma infinidade de fotos e documentos comprobatórios das histórias relatadas. E quem pensa que aos 83 anos de idade o nosso João Louzada está aposentado engana-se e muito, pois sempre que há uma oportunidade lá está ele envolvido em campanhas de benemerência em prol dos desprotegidos.

Sem dúvida alguma, independente de concordar ou não com a linha política por ele seguida, ninguém pode discordar da honestidade de seus ideais e nem negar os grandes méritos deste nosso João Louzada.

* Entrevista concedida em novembro/2003
Infelizmente, o sr João Louzada faleceu em março de 2005